O Espiritismo

24/06/2012 18:19

Espiritismo é a doutrina dos que crêem que podem ser evocados os espíritos dos mortos.Em outras acepções, nomeadamente segundo Rivail, dito Allan Kardec (1804-1869), é compreendido como uma doutrina de cunho filosófico-religioso voltada para o aperfeiçoamento moral do homem, que acredita na possibilidade de comunicação com os espíritos através de médiuns.

Origens

Antigo Egito: Anúbis preparando um corpo.
Emanuel Swedenborg com o manuscrito de "Apocalypsis Revelata" (1766).
Franz Anton Mesmer.
As irmãs Fox (1852).
Salão parisiense com as "mesas girantes" (revista "L'Illustration", 1853).

Do xamã da América, passando pelo griot ou pelo marabuto islâmico na África, os personagens encarregados de contactar com o mundo dos espíritos (de que o submundo é uma parte), ou pelo contrário, encarregados de impedi-lo, são característicos de múltiplas culturas.

A pré-História

O espiritismo moderno é geralmente apresentado como a continuação de uma tradição ancestral comum à maior parte das civilizações.[4] · [5] · [6] · [7].

A antiguidade Oriental

No Antigo Egito, o culto dos mortos atesta a sobrevivência do espírito, constituindo-se o Livro dos Mortos em um guia com preceitos e orientações para a viagem após a morte.

No Antigo Testamento encontram-se diversas passagens alusivas a fenómenos mediúnicos, nomeadamente no Livro dos Números e no Deuteronómio. Numa delas, Moisés proíbe pitonisas e feiticeiras de comunicar com espíritos. Por outro lado, aprova as atividades mediúnicas de Eldad e Medad. Em outro trecho, Saul, primeiro rei de Israel consultou a chamada Bruxa de Endor para evocar o espírito do profeta Samuel.

A antiguidade clássica

Na Grécia Antiga era prática corrente a consulta aos oráculos, em busca de conselhos, auxílio e previsões do futuro. O mais famoso localizava-se no Templo de Delfos, dedicado aos deus Apolo, onde a pitonisa, após um banho ritual em uma fonte sulfurosa, sentava-se numa trípode (banco de três pernas) e, entre vapores de enxofre, a mascar folhas de louro (árvore sagrada de Apolo), entrava em transe e transmitia as palavras do deus. No poema "Odisseia", Homero narra o diálogo entre Ulisses e a alma de Tirésias, oráculo de Tebas. O filósofo Sócrates acreditava na imortalidade da alma. O tirano Periandro, de Corinto, consultou a alma de sua mulher (que ele próprio havia mandado degolar).

Na Roma Antiga, cuja religião sofreu forte influência dos antigos gregos, as mensagens do além eram recebidas e interpretadas pelos arúspices, personagens que interpretavam os presságios. Complementarmente, as sibilas entravam em transe para consultar os espíritos para consultar espíritos sobre as inquietudes da população. Cícero, na obra "Tusculanae", afirma que o seu amigo Ápio conversava frequentemente com os espíritos, e que no lago Avernus, sombras dos mortos apareciam na escuridão.

É através dos romanos que temos conhecimento dos druidas Celtas, que afirmavam que os homens constroem o seu destino com as ações praticadas neste mundo. As lendas de sua mitologia estão repletas de "espíritos protetores". Numa delas, o guerreiro Vercingétorix conversa com a alma de heróis mortos em combate.

A Idade Média

No contexto da Guerra dos Cem Anos, a francesa Joana d'Arc afirmava ouvir "vozes sagradas" desde menina. Entre essas destacavam-se as de São Miguel, Santa Catarina e Santa Margarida, que a incentivavam a lutar contra os ingleses. Giordano Bruno, na obra "Il Candelaio" (1582), regista a sua convicção da possibilidade de conversar com os mortos.

Emanuel Swedenborg (29 de janeiro de 168829 de março de 1772) foi um cientista e filósofo sueco. Formado na Universidade de Uppsala no equivalente hoje a Engenharia de Minas, viajou pela Inglaterra, os Países Baixos e a França. Ao retornar ao seu país, Carlos XII da Suécia convidou-o para aluno do inventor Christopher Polhem, uma das figuras mais importantes no processo de industrialização do país.

Abalado pela morte do pai em 1736, passou a empregar o seu tempo livre para provar a existência da alma, o que desembocou num estudo de anatomia.[8] Anos mais tarde, em 1743, durante um jantar em Londres viu um espírito que lhe disse: "Não coma demais". A mesma entidade manifestar-se-ia mais tarde, acordando Swedenborg de seu sono, identificando-se como Jesus Cristo e comunicando-lhe que o cientista tinha sido escolhido para revelar ao mundo o significado da Bíblia.

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Swedenborg

De 1747 até à sua morte, em 1772, viveu em Estocolmo, nos Países Baixos e em Londres. Durante esses 25 anos redigiu 14 trabalhos de natureza espiritual dos quais a maioria foi publicada durante a sua vida. Considerado um farsante por Immanuel Kant[9] e um poderoso médium por Arthur Conan Doyle,[10] as suas ideias encorajaram novas correntes de pensamento, como o Martinismo e a Teosofia.

Franz Anton Mesmer (23 de maio de 17345 de março de 1815) descobriu o que chamou "magnetismo animal", também referido como "mesmerismo". O desenvolvimento das ideias e práticas de Mesmer levou o cirurgião escocês James Braid (1795–1860) a desenvolver o hipnotismo em 1841.

O espiritismo incorporou e conservou algumas práticas inspiradas ou diretamente tiradas do Mesmerismo, entre as quais o passe, e a chamada "água fluidificada" (fluidoterapia), utilizada como um remédio para o corpo físico e o corpo espiritual.

Justinus Kerner (1786-1862) publicou em 1830 o relato de suas observações sob o título "Die Seherin von Prevorst, Eröffnungen über das Leben - Menschen und über das Hineinragen einer Geisterwelt die unsere" ("A vidente de Prevorst, considerações iniciais sobre a vida interior do ser humano e a intervenção de um mundo dos espíritos no nosso").

As irmãs Fox - Catherine "Kate" (1838–1892), Leah (1814–1890) e Margaret (1836–1893) -, tiveram um papel decisivo no surgimento do espiritismo. Eram filhas de David e Margaret Fox, e foram residir em Hydesville, Nova Iorque. Em 1848 a família começou a ouvir sons de pancadas inexplicados. Kate e Margaret realizaram sessões de canalização numa tentativa de contato com a suposta entidade espiritual que promovia os sons, e declararam ter estabelecido contato com o espírito de um mascate que fora alegadamente assassinado e enterrado sob a casa. Um esqueleto, posteriormente encontrado na cave pareceu confirmar isso. As irmãs Fox tornaram-se imediatamente em celebridade. Faziam demonstrações da sua comunicação com os espíritos usando batidas e pancadas, escrita automática (psicografia) e depois até comunicação de voz (psicofonia), quando um espírito tomou o controle de uma das meninas.

Os céticos suspeitaram que isto foi apenas um engano inteligente e uma fraude. De fato, Margaret posteriormente confessou a utilização das juntas dos dedos dos seus pés para produzir sons. E embora tenha vindo a retratar-se desta confissão, tanto ela como a sua irmã Catherine ficaram amplamente desacreditadas, tendo vindo a falecer na pobreza. Todavia, a crença na capacidade de comunicar-se com os mortos cresceu rapidamente, constituindo um movimento religioso chamado moderno espiritualismo, e contribuindo em grande medida para as ideias de Allan Kardec.

Andrew Jackson Davis (1826-1910) sem qualquer educação científica foi capaz de produzir livros muito complexos para a sua época. Ditava os seus textos enquanto se encontrava em um estado de transe profundo e adquiriu nos Estados Unidos uma reputação de médium e de magnetizador.

Logo após as notícias acerca das Irmãs Fox terem chegado à França, o interesse do público foi despertado pelo que por vezes foi denominado de "telégrafo espiritual". No início uma mesa girava com a "energia" dos espíritos presentes através de um ser humano intermediário (de onde a expressão "médium"). Mas, como o processo era demasiado lento e embaraçoso, um novo foi criado, supostamente por uma sugestão dos próprios espíritos: a "tábua falante".

Os primeiros exemplares de "tábuas falantes" eram cestos atados a um objeto pontiagudo que se movia sob as mãos dos médiuns, apontado para letras impressas em cartões espalhados em volta de, ou gravados em, uma mesa. Tais dispositivos foram chamados "corbeille à bec" ("cesto com um bico"). O objeto pontiagudo era normalmente um lápis.

Esses dispositivos eram de montagem e operação simples. Uma sessão típica consistia em pessoas a sentar-se em uma mesa redonda, os pés a descansar nos suportes das cadeiras e as mãos sobre o tampo de mesa ou, mais tarde, na própria tábua falante. A energia canalizada dos espíritos pelas mãos dos presentes fazia a tábua movimentar-se e indicar as letras que, uma vez registadas por um dos presentes, formavam palavras, frases e orações inteligíveis. O sistema foi um primitivo e menos eficiente antecessor dos tabuleiros Ouija que posteriormente se tornariam tão populares.

Kardec e a Doutrina Espírita

Em França, o professor Hippolyte Léon Denizard Rivail interessou-se pelo espiritismo quando ouviu falar das Irmãs Fox, mas o seu primeiro contato com o fenómeno foi por meio das tábuas falantes parisienses em 1854. As explicações para a causa deste, do mesmo modo que o sistema filosófico delas derivado, constituiu a base da chamada doutrina espírita.

As investigações de Rivail resultaram na publicação, sob o pseudónimo de Alan Kardec, de "O Livro dos Espíritos" (1857), o "Livro dos Médiuns"" (1861), "O Evangelho segundo o Espiritismo" (1864), "O Céu e o Inferno" (1865) e Génesis (1868). Em 1858 fundou a "Revue Spirite", que dirigiu até 1869, ano em que faleceu.

Muitas personalidades de renome, na Europa e nos Estados Unidos vieram a abraçar o espiritismo como uma explicação lógica da realidade, inclusive de temas relacionados com a transcendência, como Deus e a vida após a morte.

Na atualidade

O espiritismo é considerado como uma pseudociência ou superstição nos círculos e céticos. O físico e epistemólogo argentino Mário Bunge (1919–), em sua obra "Investigación científica" (1969), inclui-o em sua lista de pseudociências, por não cumprir com os requisitos básicos do método científico.

James Randi é de opinião de que a aceitação do espiritismo por parte do escritor escocés sir Arthur Conan Doyle (célebre por suas histórias sobre o detetive Sherlock Holmes) legitimou esta crença - que Randi considera como "incrívelmente ingénua" - como religião.

Acepção do termo no Brasil

Espiritismo codificado por Allan Kardec

O espiritismo popularmente conhecido no Brasil como Doutrina Espírita ou Kardecismo, foi codificado na segunda metade do século XIX pelo pedagogo francês Hippolyte Léon Denizard Rivail, que para fins de difusão desses trabalhos sobre o tema, adotou o pseudônimo de "Allan Kardec".

O termo "kardecista" não costuma ser o usado por parte dos adeptos, que reservam a palavra "espiritismo" apenas para a doutrina tal qual codificada por Kardec, afirmando não haver diferentes vertentes dentro do espiritismo, e denominando correntes diversas de "espiritualistas"[11]. Estes adeptos entendem que o espiritismo, como corpo doutrinário, é um só, o que tornaria redundante o uso do termo "espiritismo kardecista". Assim, ao seguirem os ensinamentos codificados por Allan Kardec nas obras básicas (ainda que com uma tolerância maior ou menor a conceitos que não são estritamente doutrinários, como a apometria), denominam-se simplesmente "espíritas", sem o complemento "kardecista".[11] A própria obra desaprova o emprego de outras expressões como "kardecista", definindo que os ensinamentos codificados, em sua essência, não se ligam à figura única de um homem, como ocorre com o cristianismo ou o budismo,mas a uma coletividade de espíritos que se manifestaram através de diversos médiuns naquele momento histórico, e que se esperava continuassem a comunicar, fazendo com que aquele próprio corpo doutrinário se mantivesse em constante processo evolutivo. Outra parcela dos adeptos, no entanto, considera o uso do termo "kardecismo" apropriado.O uso deste termo é corroborado por fontes lexicográficas como o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa[15], o Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa o Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa e o Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa.

José Lacerda de Azevedo, médico espírita brasileiro, compreendia o kardecismo como uma "prática ou tentativa de vivência da Doutrina Espírita" criado por brasileiros "permeada de religiosidade, com tendência a se transformar em crença ou seita".

As expressões nasceram da necessidade de alguns em distinguir o "espiritismo" (como originalmente definido por Kardec) dos cultos afro-brasileiros, como a Umbanda. Estes últimos, discriminados e perseguidos em vários momentos da história recente do Brasil, passaram a se auto-intitular espíritas (em determinado momento com o apoio da Federação Espírita Brasileira), num anseio por legitimar e consolidar este movimento religioso, devido à proximidade existente entre certos conceitos e práticas destas doutrinas. Seguidores mais ortodoxos de Kardec, entretanto, não gostaram de ver a sua prática associada aos cultos afro-brasileiros, surgindo assim o termo "espírita kardecista" para distingui-los dos que passaram a ser denominados como "espíritas umbandistas".

Cultos afro-brasileiros

No Brasil, o termo "espiritismo" é historicamente utilizado como designação por algumas casas e associações das religiões afro-brasileiras, e seus membros e frequentadores definem-se como "espíritas", nomeadamente a Umbanda, como por exemplo a atual Congregação Espírita Umbandista do Brasil, com sede no estado do Rio de Janeiro.

  Mesmo congregando elementos católicos, africanos e do ocultismo, a umbanda se constituiu como uma modalidade de espiritismo. É o que indicam os primeiros livros que identificavam a nova religião. Seus mentores criam em 1939 a Federação Espírita de Umbanda, e em 1941 realizam o I Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda.  

 

No Brasil Império a Constituição de 1824 estabelecia expressamente que a religião oficial do Estado era o Catolicismo. No último quartel do século XIX, com a difusão das idéias e práticas espíritas no país, registraram-se choques não apenas na imprensa, mas também a nível jurídico-policial, nomeadamente em 1881, quando uma comissão de personalidades ligadas à Federação Espírita Brasileira reuniu-se com o Chefe de Polícia da Corte e, subsequentemente, com o próprio Imperador D. Pedro II, e após a Proclamação da República Brasileira, agora em função do Código Penal de 1890, quando Bezerra de Menezes oficiou ao então presidente da República, marechal Deodoro da Fonseca, em defesa dos direitos e da liberdade dos espíritas. Outros momentos de tensão registrar-se-iam durante o Estado Novo nomeadamente em 1937 e em 1941, o que levou a que a prática dos cultos afro-brasileiros conhecesse uma espécie de sincretismo sob a designação "espiritismo", como em época colonial o fizera com o Catolicismo.

Com relação à Umbanda, surgida em 1908 no estado do Rio de Janeiro, a postura da Federação Espírita Brasileira ao longo da história foi ambígua:

  Ainda que o espiritismo kardecista tivesse predileção por espíritos brancos, nos anos 1920 não era raro se encontrar caboclos e pretos-velhos produzindo curas e outras benemerências em centros espíritas.
 

Como exemplo, a decisão do Conselho Federativo da Federação Espírita Brasileira, em outubro de 1926, conclui:

  A Federação, em tese, não infirma [invalida] as manifestações de 'caboclos' nem de 'pretos', conquanto não os adote como norma mais eficiente de trabalho, (...) achando que, do mesmo modo devem proceder as sociedades adesas, uma vez que (...) tais práticas são, não há que negar, Espiritismo, porém não Doutrina Espírita (...).
.

Essa postura mudou na década de 1940, nomeadamente a partir do reconhecimento da Umbanda como religião pelo Congresso Nacional em 1945:

  (...) para os kardecistas espiritismo e umbanda precisavam ser diferenciados. A enorme heterogeneidade dos centros espíritas passou a incomodar aqueles que buscavam uma doutrina mais unificada e definida.
.

Nesse período, a aceitação social da crença é cada vez mais ampla, o que é demonstrado quando da promulgação das alterações ao Código Penal brasileiro, em 1949, quando o termo "espiritismo" foi excluído, permanecendo apenas, como delito grave, a prática do "curandeirismo" e do "charlatanismo".[24]

A FEB chegou a publicar, em 1953, em seu órgão oficial, que os umbandistas poderiam ser considerados "espíritas", com o seguinte argumento: "Baseados em Kardec, é-nos lícito dizer: todo aquele que crê nas manifestações dos espíritos é espírita; ora, o umbandista nelas crê, logo, o umbandista é espírita."[25] Esse raciocínio causou polémica à época. Anos mais tarde, em 1958, o Segundo Congresso Brasileiro de Jornalismo e Escritores Espíritas opôs-se considerar os umbandistas como espíritas. Duas décadas mais tarde, em fevereiro de 1978 o mesmo Reformador publicou que a designação de "espíritas" pelos umbandistas é "imprópria, abusiva e ilegítima".

Na prática, sinteticamente, as semelhanças entre a prática Umbanda e a Doutrina Espírita são: a comunicação entre os vivos e os mortos, admitindo ambas, por conseguinte, a sobrevivência à morte do chamado "espírito"; a evolução do espírito através de vidas sucessivas (reencarnação); o resgate, podendo ser pela dor e sofrimento, das faltas cometidas em anteriores existências; a prática da caridade.[26]

Por outro lado, as principais diferenças são a admissão pela Umbanda: de cerimônias litúrgicas como o batizado e o matrimônio; a presença de imagens em seus cultos; o emprego de plantas em seus cultos; a música dos pontos cantados para as entidades.[27]

De todas as religiões afro-brasileiras, a mais próxima da Doutrina Espírita é um segmento (linha) da Umbanda denominado de "Umbanda branca", que guarda pouca ligação com o Candomblé, o Xambá, o Xangô do Recife, o Tambor de Mina ou o Batuque.

Adeptos do Candomblé.

No tocante específicamente ao Candomblé, crê-se na sobrevivência da alma após a morte física (os Eguns), e na existência de espíritos ancestrais que, caso divinizados (os Orixás, cultuados coletivamente), não se materializam; caso não divinizados (os Egungun), materializam em vestes próprias para estarem em contacto com os seus descendentes (os vivos), cantando, falando, dando conselhos e auxilindo espiritualmente a sua comunidade. Observe-se que o conceito de "materialização" no Candomblé, é diferente do de "incorporação" na Umbanda ou na Doutrina Espírita. Em princípio os Orixás só se apresentam nas festas e obrigações para dançar e serem homenageados. Não dão consulta ao público assistente, mas podem eventualmente falar com membros da família ou da casa para deixar algum recado para o filho. O normal é os Orixás se expressarem através do jogo de Ifá (oráculo).

No Candomblé, a função dos rituais durante as cerimónias de iniciação é a de afastar todo e qualquer espírito ou influência, recorrendo-se ao Ifá para monitorar a sua presença. A cerimónia só ocorre quando este confirma a ausência de Eguns no ambiente de recolhimento. Os espíritos são cultuados, nas casas de Candomblé, em uma casa em separado, sendo homenageados diariamente uma vez que, como Exú, são considerados protetores da comunidade.

Outros cultos

A título sincrético, no país são de de referir-se ainda:

O Espiritismo na Academia

Salão parisiense com as "mesas girantes" (revista "L'Illustration", 1853).
"Croquis" de um médium: gravura da obra "Extériorisation de la sensibilité" de Albert de Rochas (Paris, 1899).
Um dos experimentos de William Crookes (c. 1870).
Senhoras em uma reunião espiritualista (Chicago, 1906).

Embora a crença em uma vida após a morte remonte à pré-história, conforme o testemunham os rituais de sepultamento desde o Paleolítico Superior e o culto aos ancestrais na Antiguidade, o surgimento do espiritismo em meados do século XIX, a partir das manifestações das Irmãs Fox nos Estados Unidos despertou não apenas o interesse popular - expresso nas "mesas girantes" ou pelo tabuleiro Ouija -, mas também o da academia. Entre os pesquisadores que se dedicaram aos chamados "fenómenos psíquicos", citam-se por exemplo:

Contudo, mesmo estudados por várias personalidades de renome que acabaram por contribuir de outras formas, significativas ou não, à ciência em sua acepção moderna, tais cientistas não foram capazes de elucidar ou concluir pela existência de fatos que obedeçam aos rigores científicos e que levem à conclusão segura da realidade natural dos espíritos. A metodologia utilizada pelas correntes espíritas ou é bem diferente ou transcende o método científico, e por tal o espiritismo permanece, ainda hoje, como tema não científico quando se considera a acepção "stricto sensu" de ciência, encontrando-se o espiritismo notoriamente muito mais atrelado às religiões do que às academias científicas propriamente ditas [30][31][32].

O Espiritismo e a Medicina

Históricamente, em termos de Medicina, indivíduos com sintomas como audição ou visão de espíritos foram tratados como sendo portadores de transtornos mentais, e hoje em dia ainda o são, dado o não reconhecimento científico da existência de espíritos ou entidades sobrenaturais responsáveis por tais fenômenos.

Sendo verdade que desde 1998 a Organização Mundial de Saúde, que até então definia o conceito de saúde apenas como o estado de completo bem-estar biológico, psicológico, e social do ser humano, passou a defini-lo como o estado de completo bem-estar do ser humano integral, biológico, psicológico e espiritual, deve-se ressaltar que o termo espiritual nessa sentença não implica o reconhecimento da existência de espírito atrelado ao corpo, como alguns poderiam supor. A medicina não reconhece a famosa "possessão espiritual" conforme moldes religiosos, embora reconheça transtornos de "possessão" conforme definido inclusive na Classificação Internacional de Doenças.

A Classificação internacional de doenças (CID) em sua atualização de 2006, a CID-10, prevê, em seu item F.44.3 os chamados "Estados de transe e de possessão", definidos como:

"Transtornos caracterizados por uma perda transitória da consciência de sua própria identidade, associada a uma conservação perfeita da consciência do meio ambiente."

Contudo, explicitamente descreve em alínea seguinte:

"Devem aqui ser incluídos somente os estados de transe involuntários e não desejados, excluídos aqueles de situações admitidas no contexto cultural ou religioso do sujeito."

Nesse sentido é feita a distinção entre o estado de transe normal - a exemplo a hipnose, não mais considerado doença - e o transtorno dissociativo psicótico, uma patologia psiquiátrica. Exclui-se desse item também, entre outros, a esquizofrenia. Evidencia-se também que o estado de transe e possessão sob enfoque médico não vincula-se cientificamente, de forma explícita, às causas religiosas evocadas por muitos para explicá-los.

A existência de espíritos e a possessão em moldes religiosos, ou seja, incorporação de espírito, permanecem assim, até a corrente data, como fenômenos que transcendem a realidade à luz da ciência, o que abrange não apenas as ciências naturais como também as sociais, a exemplo o sistema jurídico. Não se imbui inocência a alguém por esse dizer-se "possuído" no momento do delito, imputando-se assim a culpa ao espírito possessor e não ao réu, a exemplo.

Fenômenos de transe e possessão conforme entendidos nesse artigo, embora outrora houvessem sido alvo de investigações científicas, sobretudo nos séculos XVII e XVIII, têm por tal natureza totalmente religiosa e não encontram corroboração alguma à luz da ciência moderna.

O Espiritismo na cultura popular

Na cultura popular, muitas obras de arte apresentam ou contêm alusões a fatos, circunstâncias e conceitos que se assemelham a algumas crenças espíritas:

Literatura

O percurso de Dante do mundo espiritual, em um exemplar da Divina Comédia: ao lado da entrada para o inferno, os sete terraços do Monte Purgatório e a cidade de Florença, com as esferas do Céu acima (afresco de Domenico di Michelino, 1465).
"Hamlet e o fantasma" (gravura de Henry Fuseli, 1789).
  "Outrora, quando vivias, honrámos-te como um deus, / nós os argivos; hoje, aqui exerces o teu poder sobre os mortos. / A ti, nem mesmo a morte te causa tristeza, Aquiles." / Assim falei. De imediato, disse-me em resposta: / "Não me elogies a morte, ilustre Ulisses. / Eu preferia trabalhar a terra como teta [escravo] de alguém, / De um homem pobre que não tivesse grandes recursos, / A reinar sobre quantos mortos pereceram."  

Cinema

  • Sole Survivor (1970), um filme para a televisão protagonizado por Vince Edwards e Richard Basehart, desenvolve um enredo que se inicia com a queda de um bombardeiro B-25 Mitchell no deserto da Líbia durante a Segunda Guerra Mundial com a morte de todos os membros da tripulação. Décadas mais tarde, os destroços são localizados e uma equipa da Força Aérea é enviada ao local do acidente para investigá-lo. Os espíritos dos membros da tripulação, inconscientes de sua condição de mortos, continuam no local, à espera de serem salvos por uma expedição de resgate. O comportamento dos espíritos dos mortos nesta história é coerente com os ensinamentos da doutrina espírita.[38]
  • Ghost (1990), protagonizado por Demi Moore e Patrick Swayze, é uma das primeiras representações de fenómenos após-vida similares aos referidos pela Doutrina Espírita em uma produção cinematográfica. Swayze desempenha o papel de um homem jovem que é morto por um ladrão, deixando a sua esposa (Moore). Ele, como espírito, faz contato com uma médium, interpretada por Whoopi Goldberg e tenta auxiliar a sua esposa antes de partir do plano terrestre. A trama gira em torno da existência e sobrevivência dos espíritos e da possibilidade de comunicação entre os dois planos da vida.
  • What Dreams May Come (1998), protagonizado por Robin Williams, falecido marido de uma artista plástica que já havia perdido os filhos num acidente de automóvel. A trama gira em torno da existência de diferentes planos espirituais, da possibilidade de comunicação entre eles, e da influência que os espíritos além da vida podem exercer sobre os vivos.
  • The Sixth Sense (1999), protagonizado por Haley Joel Osment no papel de um rapaz com capacidades mediúnicas, que recebe assistência de um psicólogo infantil (Bruce Willis) que não acredita em vida após a morte. A trama gira em torno da imortalidade da alma e da comunicação com os mortos. O filme teve seis indicações ao Óscar
  • The Gift (2000), protagonizado por Cate Blanchett, no papel de uma viúva, médium, que cobra pelos seus dons. A trama gira em torno de dois conceitos importantes para o espiritismo: os bons sempre recebem ajuda nos momentos difíceis e a mediunidade não deve servir a interesses materiais.
  • What Lies Beneath (2000), dirigido por Robert Zemeckis e protagonizado por Michelle Pfeiffer no papel de uma esposa traída que começa a ouvir vozes e a ver a imagem de uma jovem. É encaminhada a um psiquiatra pelo marido (Harrison Ford) que acredita tratar-se de algum distúrbio psicológico. O filme aborda a temática da mediunidade involuntária, que se manifesta independentemente da vontade do médium e que muitas vezes é confundida com perturbação mental.
  • The Others (2001) tem como pano de fundo a existência de diferentes planos espirituais e retrata a ocorrência de fenómenos mediúnicos de efeitos físicos, como portas que se abrem sózinhas e ruídos estranhos. Pretende ilustrar o que acontece com espíritos que não percebem que estão realmente sob a forma de espírito, de modo semelhante ao postulado pela doutrina espírita.
  • Shutter (2004) retrata uma situação razoávelmente precisa de obsessão, completa com representações de manifestações de efeitos físicos e materializações de um espírito.
  • Chico Xavier (2010), filme brasileiro protagonizado por Nelson Xavier e Ângelo Antônio, fez sucesso no país. Narra a biografia do mais famoso médium brasileiro, Francisco Cândido Xavier, tendo alcançado a marca de 3,5 milhões de espectadores.
  • E a Vida Continua... (filme) (estreia prevista para agosto de 2012), filme brasileiro dirigido por Paulo Figueiredo, com base na obra homónima (E a Vida Continua...), psicografada por Francisco Cândido Xavier. Narra a trajetória do casal Ernesto e Evelina após a morte.

Televisão

  • Medium (2005), série de televisão produzida pela NBC em que a personagem principal, uma médium, auxilia o Promotor Público a resolver crimes. A série é baseada na vida da médium norte-americana Allison DuBois, nomeadamente em sua obra "Don't Kiss Them Good-Bye";
  • Ghost Whisperer (2005), série de televisão produzida pela CBS, em que a personagem principal, uma médium, auxilia espíritos com "assuntos inacabados" a "fazer a travessia" para a "luz". A série é baseada nas atividades do médium norte-americano James van Praagh, um dos seus produtores
  • Crossing Over with John Edward (1999-2004), programa de televisão produzido pelo SyFy nos Estados Unidos e pela LIVINGtv na Grã-Bretanha com o médium estadunidense John Edward.
  • Depois da Vida (2010), programa de televisão produzido pela TVI (Portugal) e pela Telecinco (Espanha) com a médium britânica Anne Germain, membro da "Spiritual Workers Assotiation". O formato do programa é o de "talk-show", com uma apresentadora, a médium, personalidades convidadas e uma pequena plateia. Na primeira parte a médium descreve os espíritos familiares e suas mensagens à personalidade convidada para, num segundo momento, fazê-lo com pessoas na plateia. No encerramento a apresentadora regista o agradecimento e palavras finais da médium, assim como os comentários do convidado e dos elementos da plateia. A temporada de 2012 do programa apresenta novo formato, com as médiuns Janet Parker (em contato com o público) e Su Downs (desenhado o rosto de quem faleceu e deseja contato com o público)

Relação com o Catolicismo

A Igreja Católica, de acordo com uma tra­di­ção que remonta ao Antigo Testamento, proíbe a parti­ci­pa­ção em sessões espíritas, por mui­to liga­das à ideia de reencarnação.

Desse modo, em repetidas ocasiões tem condenado, com extrema dureza, o espiritismo, embora acredite que os espíritas realmente têm contato com os mortos. É exemplo dessa atitude, o chamado Auto de fé de Barcelona (1861).

A Congregação para a Doutrina da Fé, herdeira do Santo Ofício, em 1 de junho de 1917 condenou a prática do Espiritismo e proibiu aos católicos participarem, sob qualquer pretexto de reuniões espíritas:

"(...) partecipare, con medium o senza medium, servendosi o no dell'ipnotismo, a sedute o a manifestazioni spiritiche, anche se hanno un'apparenza onesta o pia, sia s'interroghino le anime o gli spiriti, sai si ascoltino le risposte, sia ci si accontenti di fare da osservatori, quand'anche si dichiarasse tacitamente o espressamente che non si vuole avere alcun rapporto con gli spiriti cattivi."

Coincidentemente, no ano anterior (1916) fora fundada, em Londres, a Igreja Católica Liberal, independente de Roma, que tem como um dos seus princípios a crença na reencarnação.

O Catecismo da Igreja Católica, inclui a prática do espiritismo entre as de adivinhação e de magia, contrárias à virtude da religião.

Atualmente um novo grupo dentro do Catolicismo, a Renovação Carismática Católica, mostra-se mais aberto ao que os espíritas definem como prática mediúnica, defendendo a valorização de uma experiência pessoal com Deus, particularmente através do Espírito Santo e dos seus dons. Entre as práticas da Renovação Carismática destaca-se a da formação de grupos de oração.